Lessa ditadura Ditadura Ronaldo Lessa* Nos últimos anos têm pontificado na imprensa brasileira artigos e reportagens que visam desqualificar a resistência democrática à ditadura militar que se instalou no Brasil a partir de 1964. No dia 17 de fevereiro, a Folha de S. Paulo, em editorial, afirmou que o que houve, na verdade, foi uma “ditabranda”, contrariando o senso comum e os documentos históricos que comprovam tortura, perseguição e exílio. É bom lembrar que em 2008 o AI-5 completou 40 anos. O Ato Institucional fechou o Congresso e deu ao regime dos generais poderes absolutos; os direitos humanos foram revogados e o País mergulhou nos chamados “anos de chumbo”. Muitos foram presos, inclusive o articulista, outros tantos torturados, como a ex-deputada Selma Bandeira, e vários mortos, como o jornalista Jaime Miranda e Manoel Lisboa, membro do Partido Comunista Revolucionário. A censura à imprensa e às artes foi instaurada, a sociedade, amordaçada. Se isso é brandura, o que seria então uma ditadura? Mas cada gota de sangue derramada durante esse período tenebroso serviu para construir a democracia que vivemos hoje. Se não fosse a luta de cada um de nós, talvez a ditadura tivesse perdurado por um período ainda maior, como ocorreu na Espanha, no Chile e em Portugal. Alguns jornalistas se ufanam de ser de direita. Desdenham das lutas sociais, são contras as minorias, os índios, os negros, pregam a pena de morte e acham que os palestinos, por exemplo, deveriam ser expulsos do Oriente Médio. Algumas publicações vão ainda além: querem destruir ícones da luta socialista, demonizando-os e tratando-os como aberrações. Uma revista de grande circulação nacional chamou Ernesto Che Guevara de “porco”, logo Che, cujo olhar encantou gerações e que era capaz de frases que desconcertavam e desconcertam os que pregam a segregação: “Hay que endurecerse pero sin perder la ternura jámas”. Isto dito por um guerrilheiro, que pegou em armas para defender o povo oprimido, tanto em Cuba quanto em outros países. O momentâneo triunfo do neoliberalismo talvez tenha estimulado esse emergir da nova direita. A crise econômica mundial, contudo, deve levá-los a rever conceitos. Economia e política não se desvinculam, pelo contrário. Os que defendem atitudes fascistas baseados na propriedade privada e no poder do dinheiro são, na verdade, como diria Brecht, analfabetos políticos. Não se dão conta de que é da sua indiferença e do seu preconceito que nascem os políticos corruptos e os miseráveis que acabam se tornando seus algozes. Felizmente, os que pensam e agem assim ainda são minoria. A grande totalidade dos jornalistas é integrada por gente que fez do seu mister uma trincheira em defesa da democracia e da liberdade. É gente que faz questão de não esquecer e de manter a memória histórica viva. É gente que evoca fatos significativos que contribuem para a construção da nossa sociedade. É gente que lembra dos 40 anos do AI-5, mas que também lembra dos 30 anos da volta de Leonel Brizola do exílio - e antes que alguém conteste, houve sim exílio. Muitos brasileiros tiveram de deixar sua pátria, quer seja por não concordar com o que viviam, quer sejam simplesmente para não serem mortos. Os exilados jamais deixaram de lutar pelo Brasil. Temos uma imensa dívida de gratidão para com eles. Não é à toa que em todos os cantos do País, se ouve: Brizola Vive! *É engenheiro e ex-governador de Alagoas |
Nenhum comentário:
Postar um comentário